terça-feira, novembro 28, 2006

O gorro vermelho

A cada novo dia um só ritual: fazer jogging pelas concorridas ruas da cidade. Ás vezes com amigos e se, se adiantasse só. Fazia os 8 km sem esforço e ao final sentava-se no parque durante 5 minutos apenas a observar. Um pai a ensinar o seu filho pequenote a andar de bicicleta, um senhora, alheia aos protestos reprovadores de quem passava a atirar pão aos pombos. Um casal muito enamorado a tentar evitar uma explosão de afectos e carinho na via pública e… No banco, ao lado dela, um gorro. Grande, vermelho, perfeito. Um gorro de Pai Natal, perdido num banco de um parque em meados do décimo primeiro mês. E olhou de novo, ali estava ele, tão lindo e sozinho.
Piscou o olho ao petiz que já conseguia avançar uns cinquenta centímetros completamente sozinho. A criança esboçou um sorriso de tamanho de todas as coisas lindas. Ela apontou para o chapéu. Vestiu-o e vestiu um sorriso. Os olhos do pequenote brilhavam. A senhora parou de alimentar os pombos e olhou. O casal afastou a paixão dos seus desejos mais prementes e, também eles, ficaram a observar a cena. Estaria ela a fazer papel de ridícula? Um gorro de Dezembro numa cabeça jovem de Novembro? Uma mãe Natal vestida com uma t-shirt antiga e calças de treino? Tirou o gorro.
A corredora olhou em frente: o pequeno aprendiz de ciclista caíra e magoara-se. “Vês? Eu não te avisei?”, admoestou o pai. “Anda vamos. A tua mãe está a tua espera”. A senhora dos pombos tinha desaparecido. O jovem casal entregara-se, uma vez mais, aos prazeres carnais.
A magia fora-se. Não mais haveriam sorrisos inocentes nem olhos brilhantes. Afinal, não passava de uma corredora que tinha encontrado um gorro vermelho. Sem ele, não existia a felicidade. Era símbolo do bem e símbolo do mal. Porque é o que todos desejam mas só alcançam num único dia, o dia em que se pode ser feliz. “Acho que perdeste isto!”, disse-lhe a amiga de todas as corridas, que surgiu de detrás do banco, pondo-lhe o gorro na cabeça. “Anda lá correr mais uns quilómetros a ver se alegras esse espírito, estás com cara de quem ainda corria mais oito!”
PS: Em resposta a um desafio aqui.

sexta-feira, novembro 24, 2006

Cantina Gourmet

Esparguete com carne (inexistente)
Escalopes de porco (cortáveis a moto serra)

E depois ainda há os especiais:

Na sopa:
Tufo de cabelos
Esfregão

No prato principal:
Azulejo
Larva
Pedra

Muito sinceramente, não preferiam passar fome? É que uma pessoa se cansa de reclamar e de mandar bocas. Um dia destes faço uma manif EXIGINDO COMIDA DECENTE ou então, o que já me passou imensas vezes pela cabeça, obrigar as senhoras da cozinha a consumir aquilo que confeccionam, o que, no estado em aquela cozinha se encontra duvido. Não, esperem, já vi que o que está na moda são as ameaças de bomba…

quarta-feira, novembro 22, 2006

Mitos Urbanos VI

Sabem quando um casal precisa de ir à rua e deixa os filhos em casa? Pronto, foi isso que aconteceu. Neste caso, os pais de uma rapariga que deixaram sozinha em casa, protegida pelo cão, um collie adulto. O casal avisou à filha para fechar e trancar todas as portas e janelas. E a rapariga, como filha obediente, assim fez. Quer dizer, houve uma janela na cave que não se queria fechar completamente. Por isso, deixou a janela como estava e subiu para o quarto.
Às 12 horas, quando decidiu que já tinha jogado no computador o suficiente foi-se deitar e aninhou-se com o seu cão. A dada altura, ela acordou sobressaltada. Ela virou-se e olhou para o relógio… Eram 2:30. que a teria acordado quando ouviu um som… Parecia que algo estava a pingar. Ela pensou que tinhVoltou a aninhar-se nos cobertores pensando no a deixado a água a correr e agora estava a pingar no lavatório. Pensando que não era nada decidiu voltar a dormir. Mas sentiu-se nervosa por isso, levou a mão fora da cama e deixou o cão lambê-la para se sentir segura. Às 3:45 voltou a acordar com o som. Estava zangada mas voltou a tentar adormecer de novo. Levou a mão de novo fora da cama e deixou o cão lamber-lhe a mão. Adormeceu.
Às 6:52 decidiu que já estava farta. O maldito som não a deixava dormir. Mesmo a tempo de os seus pais chegarem a casa. “Boa”, pensou. “Agora alguém poderá arranjar o lavatório porque sei que não deixei a água a correr”. Foi a casa de banho e lá estava o seu collie, pendurado na cortina do banheiro! O som que ouvira tinha sido o seu sangue a escorrer para uma poça, no chão. A rapariga gritou até aos pulmões não lhe permitirem mais e depois correu para o quarto para arranjar uma arma, no caso de ainda lá estar alguém… E no chão, perto da sua cama viu uma pequena nota, escrita a sangue: “Minha querida, os humanos também sabem lamber…”
PS: Se calhar sou eu que estou sensível ou então sou mesmo medricas (admito!) mas, este mito deu-me mesmo arrepios!

domingo, novembro 19, 2006

Processo/InDecisão (ou mais uma história do baú)

These are the toughts that catch my trouble head
when you are away
and I am missing you to death
...
These are the toughts that catch my trouble mind
when you are away
but I do mind
...
Escrevinhava numa fúria de inspiração quando ligava o mp3. Ela aparecia assim, como que de lado nenhum e em todo o lado, na escola, no trabalho, no metro, no autocarro. Puxava da caneta e do papel meio escrito, meio amarrotado dos jeans rasgados. A música entrava... E ecoava e não queria sair... Já ia na terceira música e ainda a primeira não tinha desaparecido. "These are... These are... Ah, já sei"... E apontava e riscava, reescrevia e relia e voltava a riscar. "Assim, está bem. Próxima. Desta não gosto! Bah..." E punha-se a carregar furiosamente nos botões. "Não gosto. Disto também não. Demasiado rápido. Demasiado lento. Esta sim!" Algumas das pessoas à volta apercebiam-se das indecisões e achavam piada ao processo criativo da criatura. Enterrava-se de tal forma no sistema que tudo à volta desaparecia. Entre paragens bruscas e pessoas a entrar e sair. Gente a amontoar-se e gente que pura e simplesmente não se importava. Gente a entrar. Gente a sair. "Não consigo acabar esta, que raiva!" Alguém do outro lado da camioneta gritou: "a senhora desculpe". E ela nada. "Olhe, faz favor?" ... Passos pesados e impacientes percorreram todo o corredor e foram até ao banco da personagem. Pararam. Como ela continuasse a não ouvir, retirou um dos phones, ao de leve, do ouvido. "Olhe vai ter de sair aqui." "Mas, porquê?" disse a personagem confusa. "É a paragem terminal..."

terça-feira, novembro 14, 2006

Luto/InDecisão

Caminhava com passos rápidos e esquivos, fintava não se sabe bem o quê... Olhava para trás só por olhar porque ver não via... Abria a mala, vasculhava-a de uma ponta à outra e retirava a chave com uma destreza só vista. Então, se um vizinho estivesse a chegar ao pé de si ainda mais depressa retirava a chave. Não queria ser vista e muito menos que lhe falassem.
Corria então pelas escadas, perdendo o fôlego a meio caminho. E ao fechar a porta atrás de si sentia-se segura, atirava o casaco para ali e a mala para acolá. Puxava o cachecol e deixava-o espalhado pelo corredor. Corria para o espelho: olhos negros e encovados, pele fria e macilenta, madeixas de cabelo caindo... Não era narcisa, apenas indecisa. Viver ou morrer ?
As paredes que a rodeavam eram cruéis, imitavam-na. Frias, vazias e pareciam querer deixar-se ficar. O telefone desligado, o e-mail entupido e cartas por abrir. Que nem se daria ao trabalho de ir verificar... Que sentido teria? Que sentido teria fazer o que quer que fosse? Pegou no diário e decidiu escrever uma carta. Escreveu para ele... Recordou os belos momentos mas, a tinta insistia em imprimir os maus. Talvez fosse melhor escrever um poema. Não, era demasiado doloroso. Escrever linhas de amor para ninguém? Atirou o diário para o chão. Foi embater de encontro as coisas dele, no canto do quarto pouco mais que vazio. Amaldiçoou-se. Correu para aquele canto tão querido. Ajeitou a almofada, dobrou os lençóis de linho branco... Tentou cheirá-los, os últimos resquícios daquela vida. Abraçou com força a almofada... Pelo canto do olho avistou um pêlo branco...
PS: Mal escrito, há muito tempo... E nem sei porquê...

quinta-feira, novembro 09, 2006

Frases assim...

Conservar algo que possa recordar-te, seria admitir que pudesse esquecer-te.

William Shakespeare